Nas últimas semanas, o tema que tomou o noticiário nacional foi mais uma vez o do combate à corrupção, na medida em que o Congresso Nacional aprovou a chamada PEC da Bandidagem e o país saiu às ruas para protestar contra tal medida. O que se sobressai, no entanto, é que os mesmos que um dia utilizavam-se do noticiário diário para se promover como heróis do combate à corrupção, hoje são favoráveis a essa PEC e à anistia aos golpistas do 08/01. Nota-se, portanto, uma clara diferença entre o discurso moralista e o verdadeiro empenho anticorrupção. Ainda, novas análises sobre a Lava Jato mais uma vez demonstram o quanto a operação agiu contra a soberania nacional. Gonet se pronuncia sobre voto de Fux e mais uma vez desmente as comparações entre a Lava Jato e o processo de Bolsonaro. E Moro segue tentando estruturar sua candidatura para 2026, mas pouco fala sobre a possível presença do PCC em seu partido e das revelações que demonstram que, quando era ministro de Bolsonaro, já sabia das fraudes no INSS. Tudo isso na Newsletter do Museu da Lava Jato de 22/09/2025.

O moralismo anticorrupção não resiste à realidade:

Pouco após, às pressas, o Congresso Nacional aprovar a PEC da Bandidagem, que planeja proteger deputados de enfrentar qualquer processo na justiça, o assunto tomou o país e as redes, que logo organizaram manifestações em todo o país, realizadas no último domingo com grande sucesso. Trata-se de um evidente acordo para proteger, simultaneamente, aqueles que pratiquem crimes dos mais comuns até aqueles que usam de seus cargos para atacar as instituições, a democracia e a soberania nacional, é o caso notório de Nikolas Ferreira e Eduardo Bolsonaro. Ambos, defensores assíduos da PEC, dizem cinicamente que a necessidade de aprovação no congresso em nada obstruiria o avanço de processos por corrupção, mas apenas seria uma medida para defender a sua liberdade de promover golpes e sanções estrangeiras.

Já há tempos o discurso moralista anticorrupção perdeu espaço no bolsonarismo, visto que a sua pauta prioritária se tornou a anistia àqueles que tentaram derrubar o governo eleito em 2022, em especial o chefe da conspiração, Jair Bolsonaro. Assim como o suposto nacionalismo, é um discurso que cai por terra na medida em que a contradição chega a níveis nunca antes vistos. Resta, porém, se perguntar: de que forma o lavajatismo lida com a PEC?

A resposta é a típica de quem precisa agradar a um grupo, mesmo que isso signifique agredir a sua principal peça de marketing: os lavajatistas ficaram em cima do muro. A primeira resposta de Moro é de que ele é contrário, mas além de ser válido aguardar se esse posicionamento se confirma na hora da votação no Senado, a sua afirmação logo é contrariada pelo seu aceno ao bolsonarismo, pois defende também que os deputados sejam blindados em casos do que chama de “crimes de opinião”. Com isso, todos sabemos, ele se refere ao discurso favorável ao golpe, aos golpistas e às artimanhas internacionais que planejaram prejudicar o Brasil para acuar os ministros do STF.

O posicionamento fica menos ambíguo quando se trata das manifestações de domingo, às quais os lavajatistas só guardam críticas. Curioso caso em que se diz contrário a uma medida, mas é muitas vezes mais contrário àqueles que agem para impedi-la. A realidade é simples: o discurso moralista anticorrupção não resiste nem ao teste da realidade, nem ao ódio muito mais latente que os lavajatistas sempre tiveram contra grupos políticos específicos.

Lava Jato age contra a soberania:

Em novo artigo publicado no Jornal GGN, pelo jornalista Luis Nassif, alerta-se sobre os riscos à segurança nacional decorrentes de decisões da Operação Lava Jato. Trata-se do caso Link-BR2, tecnologia de comunicação militar desenvolvida pela Embraer e pela FAB entre 2006 e 2009, como forma de suprir a demanda crescente de inteligência e segurança nas operações de defesa. Em 2012, a Mectron S.A., então parte do grupo Odebrecht, foi contratada para efetivar o projeto já desenvolvido, mas, com a crise decorrente das decisões lavajatistas que responsabilizavam as empresas mais do que os indivíduos culpados, a Mectron terminou por ser vendida a um grupo israelense em 2017, por um valor irrisório.

Trata-se de um tema sensível que poucas vezes é tratado com a devida importância, o da dependência estrangeira para tecnologias estratégicas indispensáveis. O caso demonstra como a estratégia de poder lavajatistas não apenas minou a economia nacional, mas também sabotou o desenvolvimento estratégico nacional. Um exemplo ainda muito recente é o das ameaças de os EUA cortarem o acesso brasileiro ao sistema GPS, um risco que jamais poderia recair sobre um país de proporções continentais e entre as principais economias globais. Ainda, o artigo também cita o caso Crypto AG, uma empresa suíça que agia em conjunto com a CIA para adulterar tecnologias militares de mais de 120 países.

O caso em questão é apenas mais um para demonstrar o caos estratégico causado por uma operação que, irresponsavelmente, pôs vários setores do país em crise, puramente para a construção de carreiras políticas para pessoas específicas, assim como prejudicar grupos pré-selecionados. No início do mês, vimos a contradição máxima quando grupos de extrema-direita declaravam-se patriotas enquanto levantavam a bandeira dos EUA e clamavam por sanções ao Brasil, entre eles estava Deltan Dallagnol, que ficou famoso por comandar uma operação que sempre agiu contra o interesse nacional.

Gonet: Processo de Bolsonaro nada tem a ver com Lava Jato:

Paralelamente, enquanto antigos líderes da Lava Jato voltam-se ao bolsonarismo para construir suas carreiras políticas, os bolsonaristas também se voltam à Lava Jato para argumentar no caso da trama golpista: mas a usam como exemplo negativo. A comparação em questão é referente à anulação dos atos da Lava Jato contra Lula por conta de vício na origem, antes mesmo da declaração da suspeição de Sérgio Moro. Tal anulação ocorreu pelo entendimento de que não cabia à 13ª Vara Federal de Curitiba julgar o caso do atual presidente, e é na mesma linha que argumentou o ministro Fux em seu desastroso voto no julgamento que concluiu em 4×1 pela condenação do ex-presidente Jair Bolsonaro por tentativa de golpe de Estado.

A despeito de enfurecerem-se quando a decisão citada culminou na anulação dos processos que levaram Lula à prisão, o voto de Fux animou-os com a possibilidade de repetir-se o mesmo processo. Ocorre que a comparação é completamente indevida, e até por isso o voto de Fux não apenas restou solitário, como também surpreendeu a comunidade jurídica. Um dos surpreendidos foi o PGR Paulo Gonet, que frustrou as aspirações bolsonaristas ao avaliar como absolutamente improvável que a tese de Fux gere qualquer consequência futura, pelo simples fato de o processo da trama golpista ter surgido no próprio Supremo Tribunal Federal, de forma que não caberia mais recurso à própria Corte, sendo esta a última instância jurídica.

Moro se silencia sobre possível presença de PCC em seu partido:

E não apenas no tema da PEC da Bandidagem que o marketing de combatentes da corrupção se fragiliza por porte dos lavajatistas. O atualmente senador Sergio Moro também falta com assertividade quando o assunto é a estrutura de poder do seu próprio partido, o União Brasil, do qual se tornou presidente regional no estado do Paraná. Apesar de mesmo nele enfrentar problemas para garantir sua candidatura a governador em 2026, visto que a contraparte de sua federação partidária, o PP, resiste à ideia e tenta lançar a ex-governadora Cida Borghetti para o cargo, o União Brasil segue como a maior chance de Moro sair por um partido grande. No entanto, como já era de se esperar em se tratando do sucessor do DEM/PFL, o partido convive com constantes suspeitas e processos por corrupção, sobre os quais Moro tem evitado comentar.

O caso mais recente diz respeito a Antônio Rueda, presidente nacional do União Brasil e aliado próximo de Moro, que tenta confirmar sua candidatura em 2026. Seu nome é citado em inquérito da Polícia Federal por possíveis conexões empresariais e políticas com o PCC. A suspeita é de que ele seria o proprietário oculto de aviões utilizados pela facção criminosa. Tais investigações surgem pouco após a notícia de que a mesma facção teria poder dentro da Faria Lima, assim como possíveis conexões com Ciro Nogueira, presidente do PP, partido federado ao União Brasil. A resposta do partido foi simplesmente acusar se tratar de artimanha do Governo Federal, visto que o partido decidiu sair por completo da base governista — local onde nunca estiveram de fato, visto o posicionamento recorrentemente reacionário de seus deputados.

Destaca-se, mais uma vez, o silêncio de Sérgio Moro sobre o caso e declarações pouco elucidativas de seu partido. Em seu mandato, o senador tem evocado um discurso moralista de grande combatente ao crime organizado, acusando o governo de não atuar corretamente nesse setor. Mais uma vez, um discurso que não sobrevive à realidade.

Moro sabia de fraudes no INSS desde 2019:

Outro elemento do passado que volta para assombrar Moro em meio a sua tentativa de construir uma carreira política é sua passagem pelo Ministério da Justiça de Jair Bolsonaro: sua única experiência política no poder executivo. Para além da conhecida improdutividade de sua passagem pelo ministério, que além de tudo acumulou as funções do Ministério da Segurança Pública — o que deixa um tanto questionáveis suas constantes críticas à atuação do governo atual —, outro elemento foi o acúmulo de algumas funções do então extinto Ministério do Trabalho. Tal posição permitiu que Moro, ainda em 2019, tomasse conhecimento das fraudes que ocorriam no INSS, às quais o senador esforça-se em acusar responsabilidade ao atual governo, sendo que foi apenas nele que se iniciou a efetiva reversão de tais esquemas.

A informação foi dada em ofício apresentado pelo senador Randolfe Rodrigues durante a CPMI do INSS, constando que Moro esteve em reunião com lideranças do Procon-SP e INSS, em 2019, quando recebeu uma lista de seguradores, empresas de serviços e instituições financeiras suspeitas. Nenhuma medida tomada pelo então ministro, em seguida, foi efetiva para impedir que o esquema de fraudes perdurasse, para apenas ser efetivamente desbaratado anos mais tarde, durante o governo ao qual hoje faz oposição.

Moro segue em campanha para 2026:

A despeito de todos os fatos citados apenas em referência às últimas semanas, que ferem com profundas contradições o seu tradicional discurso moralista anticorrupção, o ex-juiz segue focado em sua candidatura ao governo do Paraná em 2026. Mais recentemente, seu embate foi com o deputado paranaense Zeca Dirceu, possível futuro oponente nas urnas. As falas do deputado fizeram referência à esterilidade do mandato de Moro no Senado, e como sua candidatura revela-se vazia de qualquer proposta, histórico no executivo ou mesmo uma bandeira política consolidada. Já a resposta de Moro foi mais uma vez acusando o governo em meio à CPMI do INSS, a despeito de seu nome ficar cada vez mais associado ao surgimento das fraudes. Sua resposta foi focada no PT e no pai de Zeca Dirceu, José Dirceu, acusando-o de ladrão, mesmo já sendo de amplo conhecimento que suas condenações foram anuladas justamente pela imparcialidade de Moro quando era juiz do caso.

Em resumo, a campanha de Moro baseia-se em dobrar a aposta do marketing anticorrupção que construiu ao longo dos anos da Lava Jato: cada dia mais vazio e contraditório.

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