As sequelas do caso de lawfare mais notório da atualidade — a persecução penal da Operação Lava Jato contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva — mal se dissiparam, e, mais uma vez, esse mecanismo implacável é empregado de forma sistemática para minar os alicerces da democracia na América Latina.

Os métodos bélicos tradicionais para o enfraquecimento de um oponente perderam espaço para novas estratégias, tão destrutivas quanto os cercos militares. Nesse sentido, o lawfare tem se mostrado uma ferramenta poderosa para neutralizar o adversário. 

 O êxito desse método é altamente eficaz, pois para concretizar a aniquilação do opositor, se vale de um meio que ostenta uma legitimidade quase inquestionável: a lei.

Trata-se do emprego do direito como um instrumento de guerra, com o propósito de debilitar ou aniquilar um antagonista, através de uma complexa estratégia que recorre — ou abusa — do arcabouço legal como alternativa aos meios militares convencionais para alcançar objetivos operacionais. O antropólogo americano John Comaroff definiu o Lawfare como um “recurso a instrumentos legais, à violência intrínseca à lei, para perpetrar atos de coerção política”.

O ex-juiz suspeito Sérgio Moro fez da Operação Lava Jato um dos exemplos mais notórios de lawfare de que se tem notícia, utilizando com destreza os mecanismos jurídicos estratégicos, com o apoio maciço da mídia tradicional, para deslegitimar o seu alvo político — o então ex-presidente Lula.

Contudo, percebe-se que o lawfare é um expediente recorrente da extrema-direita para enfraquecer seus opositores políticos. No âmbito geopolítico, ele se consolida como uma nova modalidade da antiga prática dos Estados Unidos de salvaguardar seus interesses econômicos e estratégicos no sul global.

A aplicação seletiva e arbitrária da Lei Magnitsky por Donald Trump ilustra bem essa nova estratégia. Por um lado, o Ministro húngaro Antal Rogán, amplamente acusado de orquestrar esquemas de corrupção, foi excluído por Trump da lista de sanções da referida lei. Por outro, o Ministro Alexandre de Moraes e sua esposa foram incluídos no rol dos sancionados pelo dispositivo.

O uso tático do Direito Internacional e dos Direitos Humanos para descredibilizar aqueles que se opõem aos interesses do imperialismo norte-americano, por meio do uso iníquo da Lei Magnitsky, representa uma nova fase do lawfare internacional. Da Operação Lava Jato às sanções contra ministros da Suprema Corte, a extrema-direita não hesita em tornar o uso do  lawfare cada vez mais inescrupuloso para neutralizar aqueles que contrariam seus interesses.

Em 2009, na Cúpula Pan-Americana de Juízes sobre Direitos Sociais e Doutrina Franciscana, o Papa Francisco advertiu que “o lawfare, além de colocar em sério risco a democracia dos países, é comumente usado para minar processos políticos emergentes e tende a violar sistematicamente os direitos sociais”.

Atualmente, torna-se evidente que o lawfare não pode ser compreendido como um mecanismo restrito às fronteiras nacionais, dado o emprego do direito no campo estratégico-militar como tática de guerra, persistindo como um dos maiores perigos para a democracia na atualidade, sobretudo para o sul global.

COMAROFF, Jean; COMAROFF, John L. Law and Disorder in the Postcolony by Review by: Giovanni Arrighi American Journal of Sociology Vol. 114, No. 2 (September 2008), pp. 562 -564.

BBC NEWS BRASIL. EUA espionaram Petrobras, dizem papeis vazados por Snowden. Disponível em https://www.bbc.com/portuguese/noti cias/2013/09/130908_eua_snowden_ petrobras_dilma_mm. Acesso 05 out. 2025;

MARTINS, Zanin C. et al. “Lawfare, uma introdução”. Editora Contracorrente, 2019.