A Operação Lava Jato produziu efeitos deletérios nos mais diferentes âmbitos da vida brasileira. E na economia, a atuação politicamente direcionada e interessada da força-tarefa também gerou impactos catastróficos, dizimando, por exemplo, a recente indústria naval brasileira. É isso o que evidencia o livro “À deriva da maré: padrões de desenvolvimento e de trabalho no Polo naval de Rio Grande”, escrito pela socióloga Ana Paula Ferreira D’Avila e publicado pela Editora Appris.

A obra, que foi a tese de doutorado da autora na Universidade Federal do Paraná, destaca que durante os governos do Partido dos Trabalhadores, com Lula e Dilma Rousseff (2003 a 2014), o papel indutor do Estado foi reativado, inaugurando um ciclo conhecido como “novo-desenvolvimentista”. Com o novo parâmetro de governo, preocupado (entre outras coisas) em elaborar uma política industrial, a indústria naval conseguiu ressurgir, com desconcentração do parque naval (tradicionalmente situado no Rio de Janeiro) e direcionamento do desenvolvimento econômico para outros lugares e regiões. E uma das localidades beneficiadas por essa estratégia foi o município de Rio Grande, localizado no extremo sul do Rio Grande do Sul, onde dois estaleiros foram construídos.

Inicialmente, a previsão era que esses estaleiros atingissem a maturidade com 20 anos, quando abririam suas carteiras de encomendas para o mercado internacional. Até lá, as indústrias se manteriam mediante licitações com a principal contratante, a Petrobras, e o início desse esforço foi promissor. O florescimento dessa indústria na região ocorreu entre 2010 e 2014, com auge em 2013, quando 20 mil postos de trabalho chegaram a ser gerados. A partir de 2015, contudo, o setor entra em crise e essa indústria acaba passando por um desmonte.

“No lugar da indústria pujante, restou um amontoado de sucata destinado ao ferro-velho, empregos destruídos e interrupção de um projeto de desenvolvimento regional”, relata a autora, citando ainda que, em 2016, todos os trabalhadores do estaleiro foram demitidos e o desenvolvimento dessa indústria no país foi interrompido por uma política que preferiu enviar as encomendas da Petrobras para a Ásia.

“O ocaso do Polo penalizou os trabalhadores e condenou a cidade a uma situação de precariedade. A princípio, o Polo Naval foi um caso de sucesso, de uma política exitosa, mas que não resistiu ao quadro político que se instaurou no país e às crises econômicas mundiais”, escreve ainda D’Avila, ressaltando que a derrocada do novo ciclo industrial no Brasil está relacionado com a guinada política ocorrida no país em 2016 e com a condução da Lava Jato sob o intuito de combater a corrupção.

“Contudo, este combate se estendeu, por motivos que fogem da nossa alçada compreender, mas que são visíveis e evidentes, ao desmonte da indústria naval e, por conseguinte, ao trabalho dos metalúrgicos e metalúrgicas navais não só do Polo Naval e Offshore de Rio Grande, mas de todos os Polos Navais de norte a sul do Brasil. Ao que tudo indica, os trabalhadores e trabalhadoras pagaram com o seu emprego, o ‘preço’ do combate à corrupção, segundo os termos em que se orientou a campanha entre agentes do Estado e da mídia.”

A obra pode ser adquirida no site da editora Appris.