O ano é 2016. A Operação Lava Jato estava no seu auge midiático, pouco tempo depois de vivenciar um dos momentos mais controversos de sua história. Foi no dia 16 de março, quando o então juiz Sergio Moro decidiu divulgar ilegalmente diálogos entre Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff. Uma decisão que incendiou o país e levou o Supremo Tribunal Federal (STF) a anular a posse de Lula como ministro do governo Dilma, tudo isso às vésperas da abertura do processo de impeachment e da deposição da petista.

Na época, a situação levou a defesa de Lula a fazer uma representação contra Moro na Corregedoria Regional da Justiça Federal da 4ª Região. Afinal, a gravação divulgada pelo magistrado não só envolvia uma presidente da República (o que significa que o caso deveria ter sido remetido ao STF imediatamente, e não à imprensa), mas ainda havia sido feita cinco horas depois do próprio juiz mandar interromper a escuta telefônica. Ilegalidades tão claras, tão evidentes, que ensejaram um pedido de abertura de Processo Administrativo Disciplinar contra Sergio Moro e um pedido de afastamento cautelar do magistrado.

Essencialmente, a defesa de Lula reclamava: 1) da manutenção nos autos de áudio de comunicação telefônica interceptada sem ordem judicial – porque ocorrida posteriormente à determinação de interrupção da medida investigatória; 2) a manutenção de áudios cujos conteúdos estariam totalmente desvinculados do objeto da investigação; 3) do levantamento do sigilo judicial das gravações, o que resultou na ampla e imediata divulgação dos áudios – inclusive daquele gravado sem ordem judicial e assim mesmo mantido nos autos – nos veículos de comunicação social.

Era evidente que as reclamações feitas pelos advogados procediam. Não à toa, o máximo que Sergio Moro conseguiu fazer para se defender foi dizer que não havia percebido “eventuais e possíveis reflexos para a própria Exma. Presidenta da República”.

Para a sorte do então juiz federal, no entanto, pouco importava a gravidade das acusações contra si e a fragilidade dos argumentos que apresentava em sua defesa. Isso porque o Tribunal Regional Federal da 4ª Região jamais deixaria sua “estrela” em maus lençóis. Só que o desembargador federal Rômulo Pizzolatti, relator do caso na Corte, acabou exagerando na sinceridade ao votar para negar provimento ao recurso da defesa de Lula.

Basicamente, ele declarou, expressamente, a 13ª Vara Federal de Curitiba, onde tramitavam os processos da Lava Jato, um tribunal de exceção. Ou seja, havia uma espécie de ditadura judicial no país, onde um juiz não precisava obedecer à Lei e nem a Constituição.

“De início, impõe-se advertir que as regras jurídicas só podem ser corretamente interpretadas à luz dos fatos a que se ligam e de todo modo verificado que incidiram dentro do âmbito de normalidade por elas abrangido. É que a norma jurídica incide no plano da normalidade, não se aplicando a situações excepcionais”, começou afirmando o desembargador. “Ora, é sabido que os processos e investigações criminais decorrentes da chamada “Operação Lava-Jato”, sob a direção do magistrado representado, constituem caso inédito (único, excepcional) no direito brasileiro. Em tais condições, neles haverá situações inéditas, que escaparão ao regramento genérico, destinado aos casos comuns. (…) A ameaça permanente à continuidade das investigações da Operação Lava-Jato, inclusive mediante sugestões de alterações na legislação, constitui, sem dúvida, uma situação inédita, a merecer um tratamento excepcional”, escreveu ainda Pizzolatti em seu voto.

Abaixo, confira os trechos da decisão do TRF4 onde a Corte declara, expressamente, a 13ª Vara Federal de Curitiba como um ‘tribunal de exceção’. Em seguida, também é possível conferir na íntegra a peça processual com o voto do desembargador que livrou Moro de ser punido no caso referido.