Por Willian Carneiro Bianeck

“Esta Portaria regula o impedimento de ingresso, a repatriação, a deportação sumária, a redução ou cancelamento do prazo de estada de pessoa perigosa para a segurança do Brasil ou de pessoa que tenha praticado ato contrário aos princípios e objetivos dispostos na Constituição Federal”. Assim dispõe o artigo 1º, da portaria 666, publicada em 26 de julho de 2019, pelo então Ministro da Justiça e Segurança Pública Sergio Moro. A data da publicação da normativa é importante, pois estava em andamento a série de reportagens sobre a Vaza Jato, do The Intercept, que revelavam os esquemas nada republicanos que Moro e seus amigos do Ministério Público Federal de Curitiba tinham para impor um projeto político por meio de um método nada ortodoxo de aplicação da lei. Um dos principais signatários da Vaza Jato foi Glenn Grennwald, jornalista estadunidense casado com o Deputado Federal David Miranda.


Glenn poderia ser enquadrado como “pessoa perigosa” nos termos da portaria, pois, em tese, atentava contra a nossa soberania ao descortinar o passado oculto do atual Senador Moro. Isso, pois, a vagueza do texto da normativa era bem conveniente, podendo qualquer pessoa ser enquadrada como terrorista a bel prazer da autoridade que assim entendesse. Além disso, a portaria criou uma espécie de tribunal de exceção da deportação: estrangeiros seriam expulsos ou deportados do país num procedimento sumário, limitando-se o direito de defesa efetivo.
O Ministério da Justiça afirmou que a publicação da portaria, hoje revogada, nada tinha relação com o jornalista estrangeiro, pois se tratava de mero ato de rotina.


Especialistas em imigração e direitos migratórios criticaram severamente a normativa de Moro. Maristela Basso, professora de Direito Internacional da Universidade de São Paulo (USP), BBC Brasil afirmou que: “O Ministério da Justiça não pode, a fim de atingir uma pessoa, editar uma medida dessa que tem repercussão geral, vai afetar milhões de pessoas”. Segundo a Defensoria Pública da União (DPU), “De acordo com a portaria, o delegado de Polícia Federal vai processar as medidas, decidir e executar. Essa concentração das etapas que norteiam qualquer processo retira a imparcialidade do ato decisório, afrontando os princípios do contraditório e da ampla defesa”.


A pressão da imprensa e dos órgãos oficiais foi tamanha que no mesmo ano Sergio Moro criou a portaria 770, publicada em 14 de outubro de 2019, relaxando um pouco as medidas autoritárias, mas ainda mantendo aberta a possibilidade de expulsão ou impedimento de entrada de estrangeiros perigosos, apenas com um prazo maior para a sua defesa.